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PROCESSO: 0000478-44.2011.5.04.0791 RO

  

EMENTA

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PÚBLICO. O ente público que se beneficiou diretamente da mão de obra decorrente do contrato de prestação de serviços responde subsidiariamente pelos créditos trabalhistas reconhecidos judicialmente quando demonstrada a culpa in vigilando. Adoção das Súmulas nº 331, itens IV e V, do TST, e 11 deste Tribunal.  

ACÓRDÃO

por unanimidade de votos, dar parcial provimento ao recurso do segundo reclamado para autorizar seja deduzido da condenação o valor de R$ 1.968,63 pago pelo segundo reclamado diretamente à reclamante. Por unanimidade de votos, dar parcial provimento ao recurso adesivo da reclamante para acrescer à condenação o pagamento de R$ 3.000,00 a título de indenização por danos materiais e morais, bem como de honorários advocatícios de 15% sobre o valor bruto da condenação, observada a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado. Valor da condenação que se acresce em R$ 1.500,00. Custas majoradas em R$ 30,00, a cargo da primeira reclamada. 

RELATÓRIO

O segundo reclamado e a reclamante recorrem da sentença de parcial procedência da ação.

O segundo reclamado requer a reforma do julgado nos seguintes itens: ilegitimidade passiva, constitucionalidade do art. 71 da Lei nº 8.666/93,  inépcia da inicial em relação ao pedido de diferenças de vale-alimentação e vale-transporte, responsabilidade subsidiária e respectivas condenações, compensação, descontos previdenciários e fiscais, juros e correção monetária, honorários periciais e custas processuais.

A reclamante, pela via adesiva, não se conforma com a decisão nos tópicos a seguir: indenização por danos morais e materiais decorrentes do atraso no pagamento de salários e honorários advocatícios.

Com contrarrazões pela reclamante e pelo segundo reclamado.

O Ministério Público do Trabalho opina pelo prosseguimento do feito na forma da lei. 

VOTO RELATOR

JUIZ CONVOCADO MARCOS FAGUNDES SALOMÃO:  

I - RECURSO DO SEGUNDO RECLAMADO

1. ILEGITIMIDADE PASSIVA

O segundo reclamado alega que não pode ser responsabilizado pelos débitos trabalhistas de empresa prestadora de serviços, por falta de previsão legal ou contratual, defendendo ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda. Pretende a reforma da sentença com a sua exclusão da lide, nos termos do artigo 267, VI, do CPC.

Entendo errônea a ideia de que a ausência de responsabilidade enseja a carência de ação por ilegitimidade passiva, pois o exame da existência de responsabilidade de cada uma das reclamadas é matéria de mérito que pode levar a procedência ou improcedência. Necessário o exame do mérito da causa para que se verifique o resultado da ação, não restando, pois, configurados os requisitos para o reconhecimento da ilegitimidade passiva da parte recorrente.

Nego provimento.

2. DECLARAÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 71, § 1º, DA LEI Nº 8.666/93

O segundo reclamado informa que o STF declarou a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, nos autos da ADC nº 16, o que afasta a possibilidade de adoção do entendimento contido na Súmula nº 331 do TST.

As normas administrativas devem ser interpretadas de maneira a não conflitarem com os princípios que regem o Direito do Trabalho, mediante a apreciação das questões de fundo junto ao mérito da demanda, inexistindo a alegada impossibilidade de adoção do entendimento contido na Súmula nº 331 do TST.

Nego provimento.

3. INÉPCIA DA INICIAL EM RELAÇÃO AOS PEDIDOS DE VALE-ALIMENTAÇÃO E VALE-TRANSPORTE

O segundo reclamando renova a alegação de inépcia dos pedidos de diferenças de vale-alimentação e vale-transporte, ao argumento de que incertos e indeterminados, não tendo a reclamante apontado os valores que entende devidos.

Não verifico a alegada inépcia em relação aos pedidos formulados, pois tem como fundamento a aplicação das normas coletivas da categoria, circunstância que afasta qualquer dificuldade, quanto ao seu entendimento, possibilitando a apreensão do efeito jurídico desejado. Inclusive, os pedidos foram devidamente contestados.

A declaração de inépcia do pedido justificar-se-ia caso o defeito de forma impedisse o exercício do contraditório, o que não ocorreu, no caso. Oportuno referir o ensinamento de Manoel Antônio Teixeira Filho, em sua obra A Sentença no Processo do Trabalho, Ed. LTr, São Paulo, 1994, p. 271:

Nego provimento.

4. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA

O segundo reclamado alega que não pode ser responsabilizado subsidiariamente pela condenação imposta. Afirma que se tratando de indivíduo que prestou serviços ao ente público sem vínculo estatutário ou empregatício, a condenação deve se limitar aos salários não pagos e aos correspondentes depósitos do FGTS, invocando a Súmula nº 363 do TST.  Defende, ainda, a ausência de prova de que a recorrida prestou serviços ao ente público de forma exclusiva durante todo o período da pretensão. Sustenta que a responsabilidade pelo pagamento de verbas rescisórias, FGTS com acréscimo de 40% e multa do art. 477, § 8º, da CLT não pode ultrapassar a pessoa do empregador. Contesta a determinação de fornecimento de guias do seguro-desemprego e de baixa na CTPS. Requer, assim, seja afastada a sua responsabilidade ou limitada ao período em que houve efetivo trabalho para o ente público.

A Súmula nº 331 do TST, em seu item V, dispõe:

O aludido item V foi editado para ajustar a Súmula nº 331 à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a partir do julgamento da ADC 16 (DJE de 06-12-2010).

No caso dos autos, a recorrente, ainda que alegue ter adotado medidas para fiscalizar o cumprimento do contrato firmado com a primeira reclamada, não faz prova cabal nesse sentido. E tanto agiu com culpa "in vigilando" que são devidas verbas trabalhistas nesta reclamatória, como deferido na decisão de primeiro grau.

Importante registrar que não se trata de responsabilizar tomadora dos serviços pelo mero inadimplemento das obrigações trabalhistas do empregador, mas demonstrar que efetivamente o ente público não adotou as medidas necessárias para fiscalizar o cumprimento das obrigações contratuais e legais por parte da prestadora, incorrendo em culpa "in vigilando", pois, caso tivesse cumprido sua obrigação direitos trabalhistas não restariam inadimplidos.

O mero fato de haver verbas trabalhistas insatisfeitas não enseja a condenação subsidiária da segunda reclamada por este julgador. O inadimplemento das obrigações trabalhistas é a prova de que a segunda reclamada não fiscalizou devidamente a empresa contratada (primeira reclamada), relativamente aos seus deveres contratuais e legais, o que evidencia a culpa "in vigilando".

Adoto, ainda, a Súmula nº 11 deste Regional:

A responsabilidade do recorrente abrange o pagamento de todas as parcelas deferidas, inclusive verbas rescisórias, depósito do FGTS com 40% e indenização pelo eventual não recebimento do seguro-desemprego por culpa do empregador, pois se inserem no âmbito das obrigações trabalhistas de que trata a Súmula nº 331 do TST. O mesmo se aplica à multa do art. 477, § 8º, da CLT, que reclama a adoção da Súmula nº 47 deste Tribunal:  MULTAS. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO TOMADOR DE SERVIÇOS. O tomador de serviços é subsidiariamente responsável pelas multas dos artigos 467 e 477, § 8º, da CLT, inclusive se for ente público.

Verifico que a determinação de baixa da CTPS foi dirigida exclusivamente à primeira reclamada, de modo que sem objeto o recurso no aspecto.

Por fim, os reclamados firmaram contrato para prestação de serviços de limpeza e higiene (fls. 158-70), e os demonstrativos de salário juntados com a inicial revelam que o trabalho da reclamante era prestado nas dependências do Fórum da cidade de Encantado, não havendo elementos que justifiquem a limitação da condenação pretendida pelo recorrente.

Destarte, afasto todas as alegações, dispositivos legais e súmulas suscitados pelo recorrente, que tenho por prequestionados.

Nego provimento.

5. COMPENSAÇÃO

O segundo reclamado requer seja autorizada a dedução dos valores já adimplidos pela empregadora, mesmo sob denominação diversa, bem como o valor de R$ 1.968,63 pago diretamente pelo recorrente à autora em dezembro de 2011.

O Julgador de primeiro grau autorizou a dedução dos valores pagos pela reclamada sobre mesmo título e observados os mesmos meses de competência (fl. 211), comando que se afigura correto, não merecendo reforma.

Os documentos juntados nas fls. 171-3 comprovam o pagamento de R$ 1.968,63 pelo recorrente à autora em razão do contrato de prestação de serviços firmado com a primeira reclamada, por força de determinação judicial (medida cautelar), os quais também devem ser deduzidos da condenação, sob pena de enriquecimento sem causa.

Dou parcial provimento ao recurso para autorizar seja deduzido da condenação o valor de R$ 1.968,63 pago pelo segundo reclamado diretamente à reclamante.

6. DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS

Os descontos previdenciários e fiscais já restaram autorizados na sentença, de modo que sem objeto o recurso no item.

7. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA

O recorrente requer que os juros e a correção monetária observem o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.497/97 e no art. 883 da CLT.

O regramento aplicável para a atualização monetária deverá ser analisado conforme as disposições legais vigentes na época em que efetuados os cálculos de liquidação, porquanto não há como saber se os atuais critérios estarão vigorando na data da liquidação.

Nego provimento.

8. HONORÁRIOS PERICIAIS

O valor de R$ 1.200,00 fixado a título de honorários periciais condiz com o trabalho realizado pelo perito, tendo em vista sua complexidade, qualidade e extensão. Está de acordo com os patamares usualmente fixados em demandas semelhantes, não se justificando a sua redução. 

Nego provimento.

9. CUSTAS

A responsabilidade pelo pagamento das custas foi atribuída exclusivamente à primeira reclamada (fl. 211-v), de modo que descabe o exame das alegações recursais no item.

II - RECURSO ADESIVO DA RECLAMANTE

1. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ATRASO NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS

A reclamante requer o pagamento de indenizações por danos morais e materiais decorrentes do atraso no pagamento de salários.

Conforme a sentença proferida, foi reconhecida a inadimplência dos salários de setembro, outubro e novembro de 2011, com declaração de rescisão indireta do contrato de trabalho (em 18 de novembro de 2011, data do ajuizamento da ação).

A testemunha trazida pela reclamante comprova que esta passou por dificuldades financeiras, tendo que quitar suas dívidas com atraso (ata de audiência na fl. 200). Os extratos bancários juntados nas fls. 25-6, por sua vez, revelam que a reclamante contratou empréstimos bancários (Cheque Especial e Crédito Pessoal Automático).

Nesse contexto, evidente o constrangimento pessoal e o prejuízo financeiro suportando em decorrência do atraso no pagamento dos salários. Caracterizado, portanto, o nexo de causalidade entre o dano e a conduta abusiva da reclamada, que não observou o prazo legal para o pagamento da verba (art. 459, § 1º, da CLT), ressaltando-se a sua natureza alimentar.

Presentes, portanto, os pressupostos necessários à responsabilização do empregador, a teor do disposto nos arts. 186 e 927 do CC, fazendo jus a reclamante ao pagamento das indenizações pretendidas.

Ante a dificuldade de se identificar, objetivamente, o prejuízo material estritamente relacionado ao atraso no pagamento dos salários, bem como de se mensurar o dano extrapatrimonial suportado, defiro o pagamento de indenização no valor de R$ 3.000,00, a título de danos materiais e morais, conjuntamente, observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, tendo em vista a última remuneração percebida de R$ 543,00 (fl. 23, doc. 4).

Dou parcial provimento ao recurso para acrescer à condenação o pagamento de R$ 3.000,00 a título de indenização pelos danos materiais e morais suportados, observada a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado.

2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

A reclamante pretende o pagamento de honorários advocatícios de 15% sobre o valor bruto da condenação.

A reclamante declara sua insuficiência econômica (fl. 20) e requer a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita (honorários assistenciais/advocatícios), instituto ampliado após o advento da Constituição Federal de 1988 que, em seu art. 133, assegura a indispensabilidade do advogado na Administração da Justiça, conforme se entende. Devido, pois, o benefício nos termos das Leis nºs 1.060/50 e 5.584/70, independentemente da apresentação de credencial sindical.

Não adoto, portanto, as orientações insertas nas Súmulas nºs 219 e 329 do TST, bem como na O.J. nº 305 da SDI-I do TST.   

Dou provimento ao recurso para acrescer à condenação o pagamento de honorários advocatícios de 15% sobre o valor bruto da condenação, observada a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado.