EMENTA:

NULIDADE PROCESSUAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. JUNTADA DE REGISTROS DE HORÁRIO. MOMENTO PROCESSUAL.

Possibilidade de juntada de documentos enquanto não for encerrada a instrução do feito, desde que seja assegurado à parte adversa a possibilidade de efetuar a contraprova. Hipótese, no entanto, em que realizada audiência una, com convocação das partes para a realização nesta condição, inclusive com produção de prova oral. Encerramento da instrução na própria audiência onde formulado o pedido de prazo para posterior  juntada de documentos.

 

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juízo da Vara do Trabalho de Pelotas, sendo recorrente PROSEGUR BRASIL S.A. TRANSPORTADORA DE VALORES E SEGURANÇA e recorrido  SINDIVIGIPEL - SINDICATO PROFISSIONAL DOS VIGILANTES, EMPREGADOS EM EMPRESAS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA E DOS TRABALHADORES EM SERVIÇOS DE SEGURANÇA PESSOAL, CURSOS DE FORMAÇÃO E ESPECIALIZAÇÃO DE VIGILANTES, SIMILARES, SEUS ANEXOS E AFINS DE PELOTAS E REGIÃO.

 

A reclamada, inconformada com a sentença das fls. 446-452, complementada à fl. 463, da lavra da Juíza Rachel de Souza Carneiro, que julgou parcialmente procedente a ação, interpõe recurso ordinário às fls. 466-475.

Pretende a reforma da decisão quanto aos seguintes aspectos: nulidade do julgado em razão de cerceamento ao seu direito de defesa, ilegitimidade do sindicato-autor para atuar em nome dos substituídos, uma hora extra por jornada de trabalho em razão da supressão da hora de intervalo e relativamente à apuração do imposto de renda.

Sem contrarrazões, sobem os autos a este Tribunal para apreciação.

Processo não submetido a parecer do
Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

 

ISTO POSTO:

1. CONHECIMENTO.

            Tempestivo o apelo (fls. 465-466), regular a representação (fl. 131), custas processuais recolhidas (fl. 473) e depósito recursal efetuado (fl. 474), encontram-se preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso.

 

2. NULIDADE DA SENTENÇA. INDEFERIMENTO DE PRAZO PARA JUNTADA DE DOCUMENTOS.

A recorrente busca a nulidade do julgado em razão de cerceamento ao seu direito de defesa, consoante lhe assegura o art. 5º, LV, da Constituição Federal e 794 da CLT. Argumenta que o indeferimento de prazo para a juntada dos registros de horário e das normas coletivas, conforme requerido na audiência realizada no dia 18.01.2010, lhe acarretou grave prejuízo, tendo sido condenada ao pagamento de uma hora extra diária, com acréscimo de 50%, pela suposta ausência de intervalo intrajornada. Refere que a ação foi ajuizada pelo Sindicato que representa diversos empregados, fato que justificaria o prazo requerido pela recorrente, que em razão  do volume de documentos envolvidos não teve tempo hábil para carrear aos autos os registros de horário, já que esses ficam em arquivo fora das dependências da empresa. Alega que os registros de horário são indispensáveis para o deslinde da controvérsia. Invoca o princípio da persuasão racional, referindo que o juiz não é desvinculado da prova e dos elementos existentes nos autos, mas a sua apreciação não depende de critérios legais determinados a priori, podendo considerar, para sua decisão, critérios críticos e racionais.

Registre-se, inicialmente, que na audiência realizada em 18.01.2010 (segunda-feira),  conforme se observa na ata da fl. 128, houve consignação de protesto da reclamada, o que autoriza o exame da matéria em sede recursal.

Consta da referida ata que a reclamada, no início da audiência, ao entregar a contestação, requereu “prazo para juntada de registros de horário dos empregados e normas coletivas, argumentando que foi notificada na segunda-feira passada e não teve tempo de reunir a documentação”, o que foi indeferido pelo Juízo, “diante dos termos da notificação e do tempo hábil para defesa”.

Verifica-se que foi registrada a discordância da parte contrária com relação ao requerimento, que referiu que “a audiência no presente processo é una conforme notificação feita pelo Juízo.”

Consoante se vê do despacho da fl. 124: “Incluo o presente feito na pauta do dia 18/01/2010, às 9h30min, para audiência UNA, ou seja, as partes devem ser notificadas para comparecerem à audiência, a fim de prestarem depoimento pessoal, sob pena de confissão, acompanhadas das suas testemunhas e apresentando, nessa mesma ocasião, as demais provas, observadas, ainda, as penalidades previstas no art. 844, da CLT. Cite-se a Reclamada, inclusive para que apresente em audiência os livros e contra-cheques mencionados nas letras "f" e "g" da petição incial, sob  pena de confissão, conforme previsto no artigo 359 do CPC.”

A sentença, considerando que “a ré não anexa controles de horário ou os referidos livros de registro como meio de comprovar a concessão dos intervalos aos substituídos elencados à fl. 07”, e tendo em vista que a prova oral não lhe favorece, entendeu que “os trabalhadores empregados da ré são credores de horas extras em razão da supressão da hora de intervalo (01 hora por dia de efetivo labor), a qual deverá ser acrescida do adicional legal (50% - cinqüenta por cento).” (fls. 449-450 e 463)

No caso dos autos, em que a ação foi ajuizada pelo Sindicato, em substituição processual (16 empregados), a justificativa oferecida pela ré, de que “foi notificada na segunda-feira passada e não teve tempo de reunir a documentação” ganha razoabilidade.

No entanto, embora considere este Relator que enquanto não for encerrada a instrução do feito é possível a juntada de documentos, desde que seja assegurado à parte adversa a possibilidade de efetuar a contraprova, na espécie, tendo sido realizada audiência una, inclusive com a produção de prova oral, tendo sido as partes previamente convocadas para a realização de audiência nesta condição (fl. 124), não há como assinar prazo para posterior juntada de documentos, tendo em vista que a instrução encerrou-se na própria audiência onde formulado o pedido.

Dessa forma, a conduta da magistrada não se configura como cerceamento de defesa, nem se caracterizou ofensa aos artigos 5º, LV, da Constituição Federal e 794 da CLT.

Nega-se provimento.

 

3. ILEGITIMIDADE ATIVA PARA A CAUSA. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL.

Insurge-se a reclamada com o reconhecimento da legitimidade do sindicato-autor para atuar em nome dos substituídos, afirmando que o inciso III do art. 8º da Constituição Federal não autoriza a substituição processual de forma indiscriminada, sendo limitada às hipóteses previstas em lei. Assevera que a presente ação não trata de um direito coletivo, mas individual, estranho aos interesses da categoria, e que inexiste na legislação vigente qualquer disposição que autorize ao sindicato atuar como substituto processual em ações que versem sobre intervalos para repouso e alimentação (pagamento como hora extra). Transcreve jurisprudência em amparo a seus argumentos. Além disso, refere que nos termos do art. 6º do CPC, ninguém poderá pleitear em nome próprio direito alheio, salvo quando o sindicato está autorizado por lei. Aduz que para a caracterização da legitimação extraordinária necessária se faz a comprovação da condição de associado de seus substituídos e de instrumentos de mandato dos empregados à entidade sindical, o que inexiste nos autos. Por outro lado, argumenta que nem a Súmula 286 do TST autoriza a substituição processual pretendida, pois a legitimidade do sindicato está adstrita a propor Ação de Cumprimento que trata de reajustes normativos, mesmo que estendida a acordo ou convenção coletiva. Da mesma forma, afirma que não se está diante da substituição processual permitida no art. 195, § 2º, da CLT e Súmula 271 do TST, as quais autorizam a atuação do sindicato em ações trabalhistas cujo objeto seja o pagamento de adicional de insalubridade ou periculosidade.

Sem razão.

O artigo 8º da Constituição da República garante aos sindicatos a defesa dos direitos e interesses individuais homogêneos de todos os integrantes da categoria, associados a eles ou não.

Não mais se discute a necessidade de autorização dos substituídos em relação à matéria a ser discutida judicialmente.

Quanto ao tipo de interesse ou direito individual que pode ser postulado pelos sindicatos pela via da substituição processual, há que se observar apenas a homogeneidade. Assim são compreendidos aqueles oriundos da lesão a um interesse geral e que podem ser defendidos tanto pelo lesado, individualmente, como pelo sindicato, em decorrência de sua natureza transindividual. A origem do dano há de ser comum, transcendendo os interesses de cada trabalhador.

Nesse sentido, transcrevem-se excertos de alguns acórdãos deste Tribunal:

“Entende-se que o inciso III do artigo 8º da Constituição Federal reconheceu poderes ao Sindicato para defesa dos interesses individuais e coletivos da categoria de forma ampla, abrangendo, inclusive, os não-associados. O cancelamento da Súmula nº 310 do TST reforça o entendimento de que o sindicato tem legitimidade ampla para atuar na defesa dos direitos e interesses da categoria profissional que representa. Sobre o tema recorde-se o estudo de Regina Maria Vasconcelos Dubugras, in “Substituição Processual no Processo do Trabalho”, Editora LTR, e o realizado pelo Juiz Ben-Hur Silveira Claus, in “Substituição Processual Sindical, Aspectos Procedimentais”, Editora LTR, ano 2003. Relevante registrar o mencionado pelo Ministro Ronaldo Lopes Leal, em artigo escrito para a Revista do Tribunal Superior do Trabalho, jan/mar 2000, antes do cancelamento da referida Súmula nº 310 falando sobre a necessidade de sua revisão considerando que seus conceitos estavam ultrapassados. O TST vem decidindo pela legitimidade ampla dos sindicatos consoante verifica-se, entre outros, nos processos nº 962/2000-013-15-00-1, Relator Ministro Carlos Alberto Reis de Paula, e o de nº 727/2000-064-15-00.2, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva. (grifos originais)” - Processo n. 0022000-86.2009.5.04.0601 RO, desta 2ª Turma - Relator o Desembargador Ricardo Carvalho Fraga, julgado em 04/8/2010 e publicado em 13/8/2010.


 “A Constituição Federal, em seu artigo 8º, inciso III, expressamente assegurou a ampla substituição processual, a ser exercida pelos sindicatos representativos das categorias profissionais, na defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, em questões administrativas ou judiciais, sem impor restrições. Assim, os direitos relativos à categoria representada pelo sindicato poderão ser defendidos pela entidade sindical na condição de substituto processual. No caso em exame, entendo que há a defesa de interesses individuais homogêneos, porquanto o sindicato profissional, na representação de um grupo de trabalhadores, ajuíza reclamatória em que “coordenados pelo mesmo fundamento de direito e de fato”, conforme ensina Wilson de Souza Campos Batalha, (in Direito Processual das Coletividades e dos Grupos, 2ª ed., São Paulo, Ed. LTr, 1992, p,. 112 apud Substituição Processual Trabalhista, CLAUS, Ben-Hur Silveira, São Paulo, Ed. LTr, 2003, pág. 114), justificando-se, assim, a manutenção da sentença que reconheceu a legitimidade ativa do Sindicato. (grifos originais)” - Processo n. 0132300-73.2008.5.04.0012 RO, da 10ª Turma - Relatora a Desembargadora Denise Pacheco, julgado em 19/8/2010 e publicado em 30/9/2010.

 

No caso dos autos, como bem referiu o juízo de origem, “o direito pleiteado é tratado em lei e norma coletiva e a decisão respectiva poderá afetar toda a coletividade de forma homogênea. O simples fato de haver diversidade de jornadas não retira do objeto a natureza homogênea, posto que o direito pleiteado diz respeito às horas extras resultantes da supressão da hora de intervalo mínima, 01 (uma) hora por jornada, nos moldes da lei consolidada.”

            Nega-se, portanto, provimento ao recurso.

 

4. HORAS EXTRAS. INTERVALOS PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO.

A recorrente pretende a reforma do julgado a fim de que seja afastada a condenação ao pagamento de uma hora extra por jornada de trabalho em razão da supressão da hora de intervalo. Assevera que conforme restou incontroverso nos autos, os empregados com cargo de vigilante patrimonial trabalham em jornada compensatória, devidamente acordada em escala de trabalho de 12x36 horas, e os empregados que prestam serviços em instituições financeiras laboram em jornada de 08h48min, de segunda a sexta-feira, com 01h12min de repouso e alimentação. Diz que, independentemente de o empregado laborar ou não no intervalo destinado ao descanso e refeição, efetua o pagamento desta hora como sendo de trabalho, porque ela está inserida na jornada compensatória conforme previsão em convenção coletiva. Por outro lado, refere que as convenções coletivas aplicáveis à espécie expressamente autorizam a redução do intervalo para repouso e alimentação de que trata o art. 71, § 4º, da CLT. Sustenta que a condenação imposta altera o que foi convalidado entre as partes em convenção coletiva, afrontando as previsões insertas no inciso II, art. 5º e  inciso XXVI do art. 7º da Constituição Federal, que trata do princípio da autodeterminação das vontades coletivas. Argumenta ser impossível qualquer interpretação extensiva das referidas cláusulas normativas, devendo ser respeitados os limites estabelecidos no negócio jurídico firmado entre as partes, agentes capazes, com objeto lícito, possível, determinado e determinável, de forma prescrita e não defesa em lei. Invoca o disposto nos artigos 8º da CLT, 113 e 114 do CC. No caso de ser mantida a condenação, entende que a não concessão integral do intervalo enseja o pagamento apenas do tempo subtraído, como extra, sendo devido somente o adicional, sob pena de enriquecimento ilícito. Invoca a OJ 307 da SDI-1 do TST. Outrossim, quanto aos reflexos, alega que não se pode olvidar da natureza indenizatória da parcela. Aduz, também, que não deve prevalecer a utilização do adicional de risco de vida na base de cálculo da parcela por expressa previsão coletiva, ferindo o princípio da autodeterminação coletiva de vontades (art. 7º, XXVI, da CF) o seu deferimento. Colaciona jurisprudência. Por fim, requer que a condenação seja limitada aos empregados nominados pelo sindicato-autor, com observância de determinados critérios, conforme enumera à fl. 471.

O Juízo de origem condenou a reclamada ao pagamento, em razão da supressão da hora de intervalo, de uma hora por dia de efetivo labor, acrescida do adicional legal de 50%, nos seguintes termos: “O primeiro ponto a ser atacado diz respeito à flexibilização do período de intervalo por autorização em norma coletiva, visto que a defesa ressalta a existência de norma a prever a supressão do intervalo mediante compensação monetária. Ocorre que o intervalo intrajornada encontra previsão legal e cogente, constituindo parcela do contrato mínimo garantido pelo Estado em defesa dos trabalhadores, como medida de zelo à higiene e saúde do empregado, que não pode, no entender desta Magistrada, ser suprimido pelas partes, sequer por manifestação de vontade coletiva. Neste sentido é a regra contida no inc. I da Orientação Jurisprudencial nº 342 da SDI-1: “OJ-SDI1-342 INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO E ALI-MENTAÇÃO. NÃO CONCESSÃO OU REDUÇÃO. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. INVALIDADE. EXCEÇÃO AOS CONDUTORES DE VEÍCU-LOS RODOVIÁRIOS, EMPREGADOS EM EMPRESAS DE TRANSPORTE COLETIVO URBANO (alterada em decorrência do julgamento do processo TST-IUJEEDEDRR 1226/2005-005-24-00.1) – Res. 159/2009, DEJT divulgado em 23, 24 e 25.11.2009 I - É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva. ...” Ora, não há como entender razoável o fato de um empregado permanecer por até 12 (doze) horas no seu posto de trabalho sem cessar suas atividades para alimentar-se, usar o banheiro ou mesmo somente descansar ou fazer higiene pessoal. [...] Ressalto que, embora não adote o entendimento expresso na OJ nº 307 da SDI-1 do e. TST, posto que os intervalos intrajornada não são computados na duração do trabalho (§ 2º do art. 71 da CLT), tal fato não altera a extensão da tutela deferida, posto que a ré não comprova a concessão de intervalo sequer parcial, em razão da ineficaz prova oral formada.” (fls. 449-450)

A partir da entrada em vigor da Lei nº 8.923/94, que introduziu o § 4º no art. 71 da CLT, a ausência de fruição do intervalo, ou o seu gozo apenas parcial, por si só, gera ao empregado, nos termos daquele dispositivo, direito ao pagamento de todo o período como de serviço extraordinário, ressalvado o entendimento da Desembargadora Flávia Lorena Pacheco, que considera devido apenas o tempo faltante para completar-se a hora integral. Cuida-se de horas extras fictas, devidas independentemente de acréscimo no limite máximo diário de efetivo trabalho, instituídas por lei com claro intuito de desestimular a inobservância do intervalo, necessário à preservação da saúde do trabalhador. Nesse sentido a O.J. nº 307 da SDI-I do TST: " Intervalo intrajornada (para repouso e alimentação). Não-concessão ou concessão parcial. Lei nº 8923/1994. Após a edição da Lei nº 8923/1994, a não-concessão total ou parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, implica o pagamento total do período correspondente, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT) ". 

Esta Turma Julgadora adota o entendimento de que o intervalo intrajornada é norma de ordem pública, objetivando a proteção da higiene, saúde e segurança do empregado, não podendo ser concedido em período inferior a uma hora sem autorização do Ministério do Trabalho, consoante o disposto no art. 71, § 3º, da CLT, ainda que haja previsão normativa.

A matéria está pacificada pela edição da Orientação Jurisprudencial nº 342 da SDI-I do C. TST e Súmula nº 38 do Regional. A consequência da violação da norma é o pagamento como horas extras do período de intervalo não concedido.

No caso dos autos, face a inexistência de qualquer comprovação acerca do efetivo gozo deste intervalo pelos substituídos elencados à fl. 07, ônus que competia à reclamada, acolhe-se a alegação da inicial de que os intervalos não foram usufruídos.

Com efeito, depreende-se do depoimento da segunda testemunha da reclamada, Sr. Fábio Renato de Almeida Peil, que: [...] costuma fazer escala de 12/36, com intervalo de 30 a 40 minutos para almoço [...] na escala de 12/36 o intervalo é só para almoçar e o posto fica sem ninguém para render o vigilante, que almoça em um local apropriado dentro do estabelecimento do cliente, quando há este local; que 30/40 minutos é só um exemplo, porque na verdade é feito um intervalo rápido para almoço, às vezes 20 minutos. O intervalo em questão pode ser de 10 minutos, se a refeição for consumida neste tempo; que esse intervalo não é registrado no livro de ocorrências do posto de trabalho porque o vigilante não chega a sair do posto [...] (fl. 129)

A primeira testemunha da ré, Sra. Izalete Mattos Vieira, por sua vez, afirmou que “faz uns cinco ou seis anos que o horário no local é das 7h15min às 12h15min e das 13h15min às 18h15min, de segunda à sexta; que antes a escala no local era de 12/36, com intervalo para almoço de uma hora, quando a depoente era rendida por um colega; [...]”, porém, estranhamente, como bem referiu a julgadora de origem, não soube dizer o nome do colega que a substituia nos intervalos, embora houvesse referido ser geralmente a mesma pessoa.

Na prática, é sabido, os vigilantes não gozam do aludido intervalo, pois para que isso acontecesse seria necessário que algum colega viesse render-lhe pelo período respectivo.

Por outro lado, os contracheques e fichas financeiras juntados aos autos (fls. 115-122, 179-195, 202-218, 222-237, 241-321, 325-378, 382-400, 403-437) não comprovam tenha havido o pagamento de horas extras em razão dos intervalos não usufruídos.

Desta forma, fazem jus os substituídos ao pagamento de 1 hora extra diária, decorrente do intervalo legal para repouso e alimentação (art. 71, caput da CLT) não integralmente usufruído, acrescido do adicional legal.

O adicional de horas extras deve ser observado também para a hora ficta da não concessão integral do intervalo para repouso e alimentação, estando correta a sentença ao considerar o adicional legal de 50%.

Com relação à natureza da verba, é salarial, pois é pagamento ao trabalho prestado, sendo aplicável a OJ n. 354 da SDI-I do TST.

No que se refere à base de cálculo da parcela, a julgadora determinou fosse observado o adicional de risco de vida.(fl. 450)

O adicional de risco de vida encontra previsão nas convenções coletivas juntadas aos autos (vide, a título exemplificativo, a cláusula 3ª - fl. 12):


ADICIONAL DE RISCO DE VIDA: As empresas pagarão, mensalmente, e tão somente aos seus empregados que executam as funções de vigilante, os assim definidos pela Lei Nº 7.102/83 (com as alterações introduzidas pela Lei Nº  8863/94), e pelo Decreto Nº 89.056/83, um adicional de risco de vida, em valor mensal equivalente a 16% (dezesseis por cento) do salário profissional efetivamente pago ao vigilante.

PARÁGRAFO PRIMEIRO – Estabelecem, ainda, que esse adicional não se reflete em qualquer outra parcela salarial ou remuneratória, tais como, hora normal, horas extras, adicional noturno, reduzida noturna, 13º salário, férias, aviso prévio indenizado, indenização adicional, etc.”

 

Como se vê, tal vantagem foi estabelecida em norma coletiva, havendo disposição expressa acerca da sua não integração em qualquer outra parcela salarial ou remuneratória, tais como, horas extras. Trata-se, pois, de liberalidade livremente ajustada em sede coletiva, devendo ser respeitada, forte no artigo 7º, inciso XXVI da Constituição Federal.

De resto, inviável a limitação requerida pela recorrente, pois consoante esclarecido na sentença de embargos de declaração (fl. 463), a magistrada destinou parágrafo próprio à questão posta, ao referir que: “Para individualização dos créditos devidos aos substituídos, deverão ser observadas as peculiaridades inerentes ao contrato individual de trabalho, em especial com relação aos afastamentos para fruição de benefício previdenciário pelos substituídos Antonio Carlos Ferreira Ribeiro e Carlos Roberto Silveira Pereira. Igualmente, deverão ser observadas as alterações contratuais referentes ao substituído Luis Carlos Moraes Aires e, dada a prescrição pronunciada, observe-se que nada é devido ao substituído Milton Luis Neto dos Santos em razão da sua promoção para o cargo de inspetor ocorrida em abril de 2003. Por fim, limita-se a condenação ao período em que os substituídos estiveram sob a tutela do sindicato autor.”

Assim, dá-se provimento parcial ao recurso da reclamada para excluir o adicional de risco de vida da base de cálculo das horas extras.

 


 5. IMPOSTO DE RENDA. BASE DE CÁLCULO.

Por fim, a recorrente requer seja observado os termos da Súmula 368 do TST para a apuração do imposto de renda, devendo ser incluídos os juros de mora na sua base de cálculo. Afirma que a exclusão dos juros da base de cálculo das contribuições fiscais não está de acordo com a legislação vigente. Invoca violação à Lei 8541/92 e ao artigo 55, XIV, do Decreto nº 3.300/99, que expressamente estabelece como tributáveis os juros compensatórios ou moratórios de qualquer natureza. Refere que a Lei 8541/92, art. 46, I, § 1º, apenas menciona a exclusão dos juros para efeito da soma dos rendimentos e não o seu total afastamento para fins de apuração do imposto de renda. Entende violada, também, a Instrução Normativa SRF nº 25, de 29 de abril de 1996, especialmente seu artigo 3º. Transcreve jurisprudência.

Sem razão.

A discussão relativa aos critérios de cálculo para apuração dos valores devidos ao imposto de renda deve ser remetida à fase de liquidação de sentença, momento oportuno para se estabelecer tal discussão, ante a possibilidade de ocorrer, no curso do processo, alterações na legislação que afetem tais cálculos.

Nega-se provimento.

 

PREQUESTIONAMENTO.

Consideram-se prequestionados todos os dispositivos legais e constitucionais invocados pela recorrente, mesmo que não expressamente mencionados à luz da OJ nº 118 da SBDI-1 do TST.

 

 

Ante o exposto,

ACORDAM os Magistrados integrantes da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: à unanimidade, dar provimento parcial ao recurso ordinário da reclamada para excluir o adicional de risco de vida da base de cálculo das horas extras deferidas (uma hora extra por jornada de trabalho em razão da supressão da hora de intervalo intrajornada). Valor da condenação que permanece inalterado.

Intimem-se.

Porto Alegre, 20 de julho de 2011 (quarta-feira).

 

 

 

 

JOÃO GHISLENI FILHO

Relator

 

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