EMENTA:

DANO MORAL. ATRASO NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS. DÍVIDAS CONTRAÍDAS PELO EMPREGADO. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES DE ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. O mero atraso no pagamento de salários, por si só, não gera direito à indenização por danos morais. Todavia, se da mora do empregador decorre inadimplemento de dívidas assumidas pelo trabalhador, com consequente inscrição do empregado no cadastro de inadimplentes de órgão de proteção ao crédito, caracterizado está o prejuízo extrapatrimonial passível de reparação. Recurso provido.

 

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da Vara do Trabalho de Porto Alegre, sendo recorrente XXXXXXXXXXXXXX e recorrido EVRED EVANGELHO DO REINO DE DEUS.

 

Insatisfeito com a sentença das fls. 174/178, complementada pela decisão em embargos de declaração de fls. 194, e que acolheu parcialmente os seus pedidos, recorre a reclamante. Nas razões das fls. 184/186, demonstra seu inconformismo com decisão, postulando sua reforma pedindo seja acrescida à condenação indenização por danos morais.

A reclamada apresenta contrarrazões às fls. 204/210, subindo, então, os autos para julgamento.

É o relatório.

 

ISTO POSTO:

DANO MORAL. ATRASO NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS. DÍVIDAS CONTRAÍDAS PELO EMPREGADO. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES DE ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO.

A reclamante não se conforma com a sentença recorrida no aspecto em que rejeitou seu pedido de indenização por danos morais sofridos em função do atraso no pagamento de salários.

Sustenta que, em função da mora no pagamento de sua remuneração, foi inscrita em cadastro de inadimplentes de órgãos de proteção ao crédito, o que lhe causou abalo moral, inclusive com desenvolvimento de quadro depressivo.

Por tais motivos, pede a reforma da decisão no particular.

À análise.

São incontroversas as alegações veiculadas na petição inicial, e reiteradas em sede de recurso ordinário, no sentido da ocorrência de atraso no pagamento de salários durante toda a contratualidade – o que teria acontecido por três meses consecutivos no fim do ano de 2006 – , e da consequente inscrição da reclamante no cadastro de inadimplentes de órgão de proteção ao crédito.

Tal conclusão é consequência da confissão da reclamada em relação à matéria de fato, decorrente do seu não comparecimento à audiência inicial.

Não obstante a ausência de dúvida quanto às circunstâncias fáticas, o juízo de origem rejeitou a pretensão da reclamante relativa aos danos morais postulados, valendo-se dos seguintes argumentos (fl. 176/177):

 

A reclamante alega que como a reclamada sempre atrasou os salários houve inclusão do seu nome no SERASA e no SPC, em 22 de janeiro de 2007. Postula o pagamento de indenização por dano moral.

Ressalto que o atraso de salário não gera abalo moral.

Além disso, os documentos das fls. 19-20 comprovam que a reclamante mesmo sabendo do alegado atraso no salário no final de 2006 continuou realizando compras em 2007, sem realizar pagamento. Agindo dessa forma a própria reclamante provocou o inadimplemento e o consequente abalo de crédito.

 

Comunga-se do entendimento do julgador a quo no aspecto em que afirma que o simples atraso no pagamento de salários, por si só, não tem o condão de caracterizar dano moral passível de indenização.

Todavia, verificando-se que em decorrência da mora no pagamento da remuneração o empregado foi impossibilitado de pagar suas dívidas, e, por consequência, inscrito no cadastro de inadimplentes de órgão de proteção ao crédito, resta evidente o prejuízo de ordem extrapatrimonial a ser reparado pelo empregador. É esse o entendimento jurisprudencial dominante, inclusive nessa Turma Julgadora. Nesse sentido:

 

DANOS MATERIAIS E MORAIS. ATRASO NO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS. Indenização devida em face da especificidade do caso, tendo em vista que a reclamada ao reincidir no atraso do pagamento dos salários, contribuiu para a inadimplência do reclamante perante seus credores, concorrendo para o dano moral sofrido pelo autor.” (Processo nº 00478-2008-662-04-00-9 RO. Relator Desembargador Ricardo Carvalho Fraga. Publicação em 16.02.2009)

 

Considerando a ausência de controvérsia quanto ao reiterado atraso no pagamento da remuneração à reclamante, e ainda quanto a sua inscrição no cadastro de devedores de órgão de proteção ao crédito, é de se reconhecer seu direito à indenização pelos danos morais sofridos.

O argumento do juízo de origem no sentido de que foi a própria empregada a responsável por sua inscrição no cadastro de inadimplentes não merece prosperar.

É certo que algumas das inscrições da reclamante no cadastro de inadimplentes – identificadas na declaração emitida pelo órgão de proteção ao crédito, juntada aos autos às fls. 19/20 – decorrem de inadimplemento de dívidas contraídas meses após a sua despedida, entretanto, essa particularidade, por si só, não afasta a configuração do dano moral e da responsabilidade da empregadora pela sua reparação.

É que, considerando-se o reiterado atraso no pagamento de salários – repisa-se, incontroverso na hipótese – a assunção de muitos dos débitos não pagos pela reclamante pode ser encarada como consequência lógica da instabilidade financeira gerada pela mora da empregadora, em especial se considerados os altos juros aplicados nos contratos de abertura de crédito no Brasil, que muito oneram o devedor, impossibilitando, por muitas vezes, a quitação da dívida.

De ressaltar ainda, que muitas desses débitos assumidos pela reclamante, se referiram a compras necessárias a sua própria subsistência e de sua família – despesas em supermercados e em lojas de bens de consumo não duráveis, por exemplo.

A menos que comprovado que a empregada tenha deliberadamente ignorado sua condição financeira à época e assumido compromissos com os quais sabidamente não poderia arcar, não há como não lhe reconhecer o direito ao ressarcimento pelos danos morais decorrentes da sua inserção no cadastro de inadimplentes dos serviços de proteção ao crédito.

No que tange ao valor da indenização, considerando as peculiaridades do caso concreto – capacidade econômica da ofensora, gravidade da conduta e extensão do dano – e também se valendo de critério comumente adotado por essa Turma Julgada na apreciação de casos análogos – por exemplo, os acórdãos proferidos nos processos nº 00478-2008-662-04-00-9, 00177-2007-661-04-00-8 e 01145-2006-202-04-00-9, publicados em 16.02.2009, 22.04.2008 e 08.10.2007, todos de lavra do Desembargador Ricardo Carvalho Fraga – condena-se a reclamada a reparar os danos morais sofridos no montante equivalente a uma remuneração mensal da reclamante, ou seja, R$ 685,80 (vinte horas-aula por semana, remuneradas à razão R$ 7,62 cada), conforme informação veiculada na petição inicial (fl. 02).

Recurso provido.

 

Ante o exposto,

ACORDAM os Magistrados integrantes da 3ª TURMA do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso ordinário para acrescer à condenação o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 685,80 (seiscentos e oitenta e cinco reais e oitenta centavos). Valor da condenação que se acresce em R$ 685,80, para todos os efeitos.

Intime-se.

Porto Alegre, 7 de outubro de 2009 (quarta-feira).

 

 

DESEMBARGADORA MARIA HELENA MALLMANN

Relatora