Acórdão do processo 0000918-65.2010.5.04.0018 (RO)
Redator: RICARDO CARVALHO FRAGA 
Participam: LUIZ ALBERTO DE VARGAS, CLÁUDIO ANTÔNIO CASSOU BARBOSA
Data: 06/11/2012   Origem: 18ª Vara do Trabalho de Porto Alegre
Andamentos do processo


PROCESSO: 0000918-65.2010.5.04.0018 RO

  

EMENTA

COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. EXTINTO BANCO NACIONAL DE CRÉDITO COOPERATIVO S.A. UNIÃO. O julgamento de dano moral e material em razão do lapso temporal entre a demissão e a readmissão do reclamante, face à suspensão atípica do contrato de trabalho do autor, é matéria que se insere na competência desta Especializada. 

ACÓRDÃO

por unanimidade, reformar a Sentença para dar provimento ao recurso do autor para declarar a competência da Justiça do Trabalho para apreciar e julgar o pedido de recolhimento das contribuições previdenciárias do período da despedida até a readmissão do recorrente; declarar a Justiça do Trabalho competente para processar e julgar o pedido de pagamento de indenização por dano moral e dano material, afastar a prescrição total, bem como determinar o retorno dos autos à origem para julgamento dos pedidos "C" e "D" da inicial, ficando prejudicado o exame dos demais pedidos do recurso ordinário do autor.  

RELATÓRIO

Ajuizada reclamatória trabalhista em face do contrato de trabalho rescindido em 20-02-1991, tendo sido readmitido em 05-01-2009, com contrato em andamento, foi prolatada Sentença às fls. 444/448.

O reclamante interpõe recurso ordinário às fls. 450/464, buscando reforma da Sentença de improcedência. Postula novo julgamento quanto aos recolhimento das contribuições previdenciárias, pagamento de indenização por danos morais e materiais, recomposição da remuneração, horas extras, reajuste da integralidade dos salários, diferenças salariais  e honorários advocatícios.

Com contrarrazões sobem os autos a este Tribunal para julgamento.

O Ministério Público do Trabalho manifesta-se pelo prosseguimento do feito à fl. 481. 

VOTO RELATOR

DESEMBARGADOR RICARDO CARVALHO FRAGA:  

RECURSO DO RECLAMANTE

Registre-se que o presente caso trata de reclamatória em que o reclamante foi empregado celetista do extinto Banco Nacional de Crédito Cooperativo S.A., sociedade de economia mista da administração pública federal. Despedido, sem justa causa, em 20.02.1991, por ocasião da reforma administrativa, promovida na gestão do Presidente Collor de Melo. Readmitido, na forma celetista, em 05.01.2009, para laborar na Superintendência Federal da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA., após ser anistiado por força da Lei nº 8.878/94.

No presente recurso serão analisados os pedidos do autor relativos à competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar recolhimentos previdenciários do período entre a sua demissão e readmissão, aproximadamente 18 anos; competência da Justiça do Trabalho para julgar e processar danos morais e materiais, em decorrência do lapso temporal entre a dispensa e a readmissão do trabalhador em face da anistia promovida pela Lei nº 8.878/94, aproximadamente 14 anos, e prescrição.

Esta 3ª Turma, em recente decisão, julgou caso muito semelhante no Acórdão 0000915-13.2010.5.04.0018 RO, de lavra do Desembargador Luiz Alberto de Vargas, com a participação dos Desembargadores Carlos Alberto Robinson e Cláudio Antônio Cassou Barbosa.

Examina-se o recurso.

1. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. RECOLHIMENTOS PREVIDENCIÁRIOS

O reclamante, postula reforma da Sentença para que seja declarada a competência da Justiça do Trabalho para apreciar o pedido de recolhimento das contribuições previdenciárias referentes ao período correspondente da  data do afastamento até a data da readmissão do autor no serviço público. Aduz que o pedido decorre de norma aplicável ao contrato de emprego. Ressalta que o § 2º do art. 8º da ON MPOG/RH n. 4/2008, prevê que o período entre o afastamento e a readmissão deve ser considerado para fins previdenciários. Alega que tal direito somente terá eficácia se forem realizados os recolhimentos do período transcorrido entre o afastamento e o retorno, pois o INSS não reconhece tal período se não houver contribuições realizadas à previdência social. Ressalta a tese inicial de que as disposições da ON 4/08 foram incorporadas ao contrato de trabalho e produzem efeitos. Aduz que somente com os recolhimentos referidos o reclamante terá o benefício previsto na ON 4/08.

A Sentença decide pela incompetência da Justiça do Trabalho, em face do inciso I do artigo 114 da Constituição da República, por se tratar de relação jurídica de custeio e não relação jurídica de trabalho.

Examina-se.

Na inicial, o autor informa que foi empregado celetista do extinto Banco Nacional de Crédito Cooperativo S.A., sociedade de economia mista da administração pública federal, despedido sem justa causa em 20.02.1991, por ocasião da reforma administrativa promovida na gestão do Presidente Collor de Melo. Foi readmitido, na forma celetista, em 05.01.2009, para laborar na Superintendência Federal do Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA. ( fl. 31; 216; Portaria nº 357/08 - fl. 226/228), após ser anistiado por força da Lei nº 8.878/94.

O pedido de recolhimento das contribuições previdenciárias refere-se ao lapso temporal entre a demissão do autor,  20.02.1991, e a readmissão pela Administração Pública, que ocorreu em 05.01.2009.

Verifica-se que o § 2º do art. 8º da Orientação Normativa MPOG/RH nº 4/2008, estabelece que o tempo de contribuição entre a data do desligamento e o efetivo retorno ao serviço conta para os efeitos de aposentadoria e pensão. (fl. 100).

Registre-se que esta 3ª Turma em várias decisões entendeu pela incompetência da Justiça do Trabalho, adotando a orientação da Súmula nº 368 do TST. Todavia, na hipótese dos autos, com debate inclusive sobre anistia, tem-se que a Justiça do Trabalho é competente para determinar o recolhimento das contribuições previdenciárias referente ao período entre a despedida e o retorno do reclamante ao serviço público. Veja-se, ainda, que, até este momento, não se editou a anunciada Súmula Vinculante do STF sobre o tema.

Ainda que controversa a competência desta Justiça Especializada para a execução das contribuições previdenciárias, no caso específico, há discussão sobre a natureza do período de afastamento. A relação de emprego foi suspensa em decorrência de ato da administração pública.

O recolhimento das contribuições previdenciárias foi interrompido em face de despedida do reclamante, decorrente de ato do Ente Público, por ocasião da reforma administrativa, promovida na gestão do Presidente Collor de Melo em 08-04-1991. A readmissão deu-se somente em 19-01-2009 em virtude da anistia concedida pela Lei nº 8.878/94.

Em recente decisão, a Desa. Maria Madalena Telesca, em julgamento de caso muito semelhante, lavrou o Acórdão que segue:

Acompanha-se o mesmo entendimento.

Assim, dá-se provimento ao recurso do autor, declarando-se a competência da Justiça do Trabalho para apreciar e julgar o pedido de recolhimento das contribuições previdenciárias do período da despedida até a readmissão do recorrente.

2. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. DANOS MORAIS E MATERIAIS

Insurge-se o autor contra a Sentença que decidiu pela incompetência da Justiça do Trabalho para julgar seus pedidos de danos morais e materiais. Pretende seja competente a Justiça do Trabalho para condenação da reclamada ao pagamento de danos morais e materiais, pela frustração sofrida durante longo período de expectativa de retorno ao emprego, 14 anos, em virtude da postergação da readmissão pela anulação de atos administrativos. Assevera que a relação de emprego é com a União, na forma celetista, e que a competência é definida a partir do pedido da demanda. Diz que, no caso, o pedido decorre de uma omissão da atual empregadora em relação a uma fase pré-contratual ou de suspensão do contrato. Aduz que a Justiça do Trabalho é competente para julgar o pedido, visto ser a Administração Pública Direta a reclamada e entre o autor e a União vigorar uma relação de emprego. Requer reforma.

A Sentença diz:

Examina-se.

Como referido anteriormente, o autor foi empregado celetista da administração indireta da União, despedido sem justa causa em 20.02.1991. Readmitido, como celetista, em 05.01.2009, para laborar no MAPA, após ser  anistiado por força da Lei  nº 8.878/94.

A Lei n.º 8.878/94 previu anistia àqueles servidores públicos civis e empregados públicos que foram dispensados com violação de dispositivo constitucional, legal, regulamentar, de cláusula constante de acordo, convenção ou sentença normativa, por motivação política ou por interrupção de atividade profissional em decorrência de movimentação grevista. (fl. 35)

A pretensão do autor decorre de relação de emprego e contrato de trabalho havido com o Banco Nacional de Crédito Cooperativo S.A., com posterior readmissão pela União, para labor junto ao MAPA. Note-se, que no caso, o reclamante retorna ao serviço público como celetista.

Diversamente do Juízo a quo, entende-se que o pleito do autor não versa sobre atos administrativos, mas, sim, sobre relação de emprego, suspensa em decorrência de ato da administração pública. A Justiça do Trabalho é competente para julgar e processar a matéria em tela por tratar-se de  suspensão atípica do contrato de trabalho.

Veja-se recente decisão do TST, em recurso de revista não conhecido, não sendo alterada a decisão do Regional, cuja recorrente é a União (Extinto Banco Nacional de Crédito Cooperativo S.A. - BNCC), Processo RR - 2248-52.2010.5.18.0004, data de julgamento: 11/04/2012, Relator Ministro João Batista Brito Pereira, 5ª Turma, data de publicação: DEJT 20/04/2012:

Dito de outro modo. O julgamento de dano moral e material em razão do lapso temporal entre a demissão e a readmissão do reclamante, face à suspensão atípica do contrato de trabalho do autor, é, portanto, matéria que se insere na competência desta Especializada.

Nesse sentido, cita-se, mais uma vez, a recente decisão desta 3ª Turma, em caso muito semelhante, Acórdão 0000915-13.2010.5.04.0018 RO.

Dianto disso, reforma-se a Sentença para declarar a Justiça do Trabalho competente para processar e julgar os pedidos de dano moral e dano material da presente demanda.

3. DA PRESCRIÇÃO. PEDIDOS DE PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS

O reclamante postula reforma da sentença para que seja afastada a prescrição e remetidos os autos à origem para apreciação do pedido de pagamento de indenização por danos morais e materiais. Entende que o prazo de prescrição deve ser contado da data da publicação da portaria nº 357/MP de 02.12.2008, em que reconhecido o direito de retorno ao trabalho pela reclamada. Aduz que o reconhecimento evidencia o equívoco da administração. Assevera que os danos causados pela União foram continuados até a data do seu retorno ao trabalho.

Examina-se.

O reclamante pretende sejam analisados os pedidos de pagamento de indenização por dano moral e dano material pela longa espera de retorno ao emprego, 14 anos, em virtude da postergação da readmissão pela anulação de atos administrativos promovidos pela União.

Conforme visto no tópico anterior a jurisprudência tem entendido que o tempo decorrido entre a demissão e a readmissão do trabalhador anistiado pela Lei 8.878/94 caracteriza suspensão, atípica, do contrato de trabalho.

Entende-se, que o prazo prescricional se inicia a partir da data da readmissão do trabalhador, anistiado pela Lei 8.878/94, porquanto o contrato de trabalho permaneceu em vigor, tendo em vista que o lapso entre a dispensa e a readmissão configura suspensão atípica do contrato.

O TST pronunciou-se acerca do marco inicial da prescrição em face da anista promovida pela Lei 8.878/94:

No caso dos autos a portaria 357/MP, que determina a readmissão do reclamante ao quadro especial em extinção do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) foi publicada no DOU em 02.12.2008 (fl. 226/228). O reclamante retornou ao trabalho em 05.01.2009 (fl. 31) e ajuizou a presente reclamatória em 25.10.2010.

Diante disso, afasta-se a prescrição total declarada pelo Juízo a quo e determina-se o retorno dos autos à origem para julgamento dos pedidos "C" e "D" da inicial, ficando prejudicado o exame dos demais pedidos do recurso ordinário do autor.