EXECUÇÃO TRABALHISTA


É sabido que, a cada dia, torna-se mais difícil e incerta a execução dos créditos trabalhistas. Os juízes do trabalho, em especial de primeira instância, constatam a proliferação de novos expedientes procratinatórios, desde recursos descabidos com argumentações cerebrinas até a sistemática e desavergonhada ocultação de bens do devedor. Como resultado, a execução trabalhista tem sido seu "calcanhar de aquiles": de que adiante o esforço dos juízes na rapidez da prestação jurisdicional -que não tem sido pequeno -, se as sentenças tornam-se inócuas, pois não se logra executá-las célere e eficazmente?

O respeito do cidadão ao Poder Judiciário se estriba, não apenas na certeza e na imparcialidade de seus julgamentos, mas também na presteza da prestação jurisdicional e no acatamento às decisões.

Não há margem para dúvidas: é justamente na ineficácia da execução trabalhista que reside a maior razão de descontentamento da população com o Judiciário Trabalhista, situação que, ao invés de melhorar ao longo do tempo, tem se agravado dia a dia.

Sem dúvida, pode-se atribuir a culpa de tal excesso de trabalho na fase de execução à própria situação econômica nacional, que joga o empregador à condição de um permanente "quase falido", tornando o "calote" apenas mais um instrumento de administração empresarial. Assim, premido pelos juros astronômicos, pela abertura do mercado para produtos estrangeiros, pela inexistência de políticas industrial e agrária, e, também, pela inadimplência geral que assola o país e vitima também as empresas, o empresariado nacional tem se tornado um "concordatário branco", a reivindicar permanentemente de seus credores maiores prazos para pagamento, menores encargos das dívidas, redução de principal, etc., com o singelo - e, em parte, verdadeiro - argumento de que, caso não haja paciência dos credores - a empresa "quebra", com sérios prejuízos para os próprios credores. Por assim dizer, os credores tornaram-se no Brasil da recessão sem fim do Plano real prisioneiros das dívidas impagáveis de seus devedores.

Tal lógica de "empurrar para frente" as dívidas se instala, hoje, também nas execuções judiciais trabalhistas. O consenso de que a falência é um mal a ser evitado e que a ninguém interessa termina por paralisar as execuções, seja por acordos das partes concessivos de mais prazo aos executados, seja por iniciativa dos próprios magistrados quando do atingimento do ponto limite em que a execução, se prosseguindo, determinaria o fechamento de uma empresa vital para a comunidade (um hospital, por exemplo). Legitimadas pela preferência do crédito trabalhistas, as Juntas se transformam em Varas Informais de Falência, passando o Juiz do Trabalho a promover liquidações gerais do patrimônio do executado, com o apoio da comunidade, dos advogados e das partes, mas sem sustentação na lei e sem estrutura judiciária para tanto.

A matéria é por demais complexa e a solução, sem dúvida, não passa por medidas processuais, mas reclama providências enérgicas e rápidas dos governantes, no sentido de implementar políticas que levem ao reaquecimento da economia, incentivos à produção, créditos para a repactuação dos débitos (especialmente os bancários), tudo criação de um mercado interno sustentável, esteio de um desenvolvimento econômico duradouro e proveitoso para a maioria da população.

De qualquer sorte, à Justiça do Trabalho, nesse momento de transição, cabe procurar encontrar meios que assegurem à execução trabalhista maior eficácia, apercebendo-se das rápidas modificações que ocorrem na sociedade e que se refletem drasticamente no processo trabalhista.

Sem qualquer pretensão de apresentar soluções, mas tão somente para iniciar o debate, apresentamos algumas propostas que visam dotar a execução trabalhista de instrumentos mais adequados à dura realidade que vivemos:


1. PREFERÊNCIA ABSOLUTA DO CRÉDITO TRABALHISTA

2. CADASTRO DE INADIMPLENTES DE CRÉDITOS TRABALHISTAS


Instalada a "cultura da inadimplência", como já observamos acima, é preciso reconhecer que os créditos trabalhistas são os que menores garantias possuem. Até o momento da execução judicial, em que tornam-se preferenciais em relação aos créditos com garantia real - e, mesmo assim, há divergências doutrinárias e jurisprudenciais a respeito -, o credor trabalhista não possui qualquer segurança de que receberá o que lhe é devido. Os Bancos e os grandes fornecedores acautelam-se com hipotecas, alienações fiduciárias e todo tipo de garantias reais que lhe permitem a rápida execução, deixando para o crédito trabalhista - que passa pela longa "via cruxis" do processo de conhecimento - o remanescente. Tal fato pesa na decisão do devedor se deve,prioritariamente, pagar o crédito de um empregado ou o empréstimo de um Banco, por exemplo, ou, ainda, pagar a Previdência Social.

É de se destacar, também, que a Receita Federal e a Previdência Social também tomam suas precauções, cruzando informações e exigindo certidões negativas para permitir a realização de transações diversas, como venda de imóveis, por exemplo. Outro fator que não incentiva o devedor a quitar seus débitos trabalhistas é a relativa inconseqüência de seu não pagamento. Ao passo que a inadimplência com a Previdência Social implica a paralisação dos negócios imobiliários e a inadimplência bancária ou comercial o fim das possibilidades de crédito (pela inclus o do devedor no rol dos inadimplentes do Banco Central ou da Serasa), uma empresa pode dever o valor integral de seu patrimônio em execuções na Justiça do Trabalho sem que isso lhe implique qualquer restrição em sua vida comercial.

Assim propomos:

a) que, por modificação legislativa, se declare a preferência absoluta dos créditos trabalhistas, mesmo situações n o falimentares, pondo fim aos debates doutrinários a respeito;

b) a criação da "Certidão de Inexistência de Débitos Trabalhistas", que passaria a ser exigida pelas instituições públicas para concorrências, licitações, transações imobiliárias, concess es de empréstimos, etc.

c) a inclus o dos devedores trabalhistas no cadastro da Serasa, em benefício da segurança das operações mercantis, de forma a prevenir os que negociam com inadimplentes trabalhistas dos riscos de tais transações.


3. DA EXECUÇÃO GERAL:


Como forma de se dar cobertura legal ao que, informalmente, já é feito em várias comarcas na Quarta Regi o, por modificação legislativa, dever-se-ia admitir que uma determinada Junta - normalmente a da sede da matriz da empresa inadimplente - possa promover uma "execução geral", concentrando todas as ações de execução que tramitam na Região contra essa empresa. A medida,certamente, facilitaria sobremaneira os acordos dos credores com o inadimplente; permitiria a distribuição mais equitativa dos valores arrecadados e vendidos nas arrematações; evitaria o "sangramento" desorganizado da empresa inadimplente - pela caótica penhora/recolhimento/arrematação de seus bens por sucessivas Juntas - até seu término pelo esgotamento de seu patrimônio; agilizaria os processos, pela concentração das decisões e dos recursos.

Parece mesmo difícil encontrar argumentos contrários a tal medida, de interesse geral da sociedade, dos credores e do próprio devedor.

Assim, em homenagem ao autor da idéia, Dr. João Luís Toralles Leite, que, já há décadas, a propunha - e, em parte, - a colocava em prática, propomos:

c) modificação legislativa que viabiliza execuções gerais, concentrando em determinada Junta da Regi o todos os processos de execução contra empresa inadimplente e em vias de insolvência.


4. DA NÃO ATRAÇÃO DO CRÉDITO JUDICIÁRIO PARA O UNIVERSO DA FALÊNCIA:


Com exceção de crédito proveniente de acidente de trabalho, o crédito trabalhista tem preferência em caso de falência.

Parece pouco lógico que, assim, os credores privilegiados tenham de, ingressando na Vara de Falência, aguardar a demorada montagem do quadro geral de devedores para, somente então, perceber o que lhe é devido. A natureza alimentar do crédito trabalhista é esquecida, tornando-se este "mais um" credor, ao lado de grandes empresas, bancos e credores com garantia real, ainda que tenha, em relação a estes, preferência.

Como complemento das propostas já apresentadas, entendemos que o crédito trabalhista possa e deva ser executado na própria Justiça do Trabalho, efetivando-se realmente a preferência prevista em lei.

Para compatibilizar tal alteração legislativa com a superpreferência do crédito acidentário, a competência tão somente para execução desse crédito em falências passaria a ser da Justiça do Trabalho. Assim propomos:

d) a execução contra empresas com falência decretada permaneceria no Judiciário Trabalhista, atraindo-se, nesse caso, também a competência para execução de créditos decorrentes de acidentes do trabalho.


Pelotas, 15 de agosto de 1997


Luís Carlos Pinto Gastal
Juiz Presidente da JCJ de Cruz Alta/RS


Luiz Alberto de Vargas
Juiz Presidente da 1a. JCJ de Pelotas/RS