A maré neoliberal que ainda varre o mundo (apesar  de claros sintomas de esgotamento) colheu em cheio o Direito do  Trabalho. A aplicação dos princípios de "desregulamentação",  "desestatização das relações" e de "flexibilização das normas"  redundou na condenação teórica de toda a legislação protetiva, de  toda a regulamentação da negociação coletiva e da mediação estatal  dos conflitos do trabalho. Aqui não há meios-termos: a própria  ESSÊNCIA da proposta neoliberal é visceralmente incompatível com o  Direito do Trabalho. Se este se fundamenta na idéia da necessidade  de uma intervenção do Poder Público para (re)constituição de um  equilíbrio entre partes que, de antemão, se reconhece iguais  apenas na forma, mas realmente desiguais; o neoliberalismo propõe  a superação de todas as "amarras éticas" quanto ao reconhecimento  da impossibilidade dos homens serem iguais, entendendo como  relevante apenas que haja igualdade formal (mesmo porque outra  seria impossível).

 

Portanto, o cardápio que o neoliberalismo nos  apresenta é do "superação" de toda a legislação protetiva (no caso  do Brasil, não apenas a CLT, mas inclusive os direitos sociais  previstos na Constituição Federal), o fim do poder normativo da  Justiça do Trabalho (por constituir-se forma despropositada de  interferência estatal nas negociações coletivas) e, mais adiante,  o fim da própria Justiça do Trabalho (evidentemente sem função, já  que toda a legislação relativa aos dissídios individuais terá sido  revogada e a tendência para a autocomposição provavelmente se  esprairá também para os dissídios individuais emergentes de  acordos coletivos).

 

Em realidade, as propostas de "flexibilização" e  "desregulamentação" das normas trabalhistas decorrem de um  processo de crescente absorção de tecnologia de ponta, de  desemprego e subemprego massivos e de "desindustrialização" de  regiões inteiras do planeta. Trata-se de um novo estágio da crise  econômica mundial, que anuncia para breve a chegada ao fim do  "beco sem saída" que o capitalismo nos levou.

 

Ainda que a embalagem colorida do neoliberalismo  procure enfatizar benefícios da "liberdade propiciada pela  ausência do Estado" (maior adequação à realidades localizadas,  maior produtividade, melhores salários), é bem difícil esconder o  amargo conteúdo da receita. A presença do Estado na economia (e  sua atividade regulatória) é incompatível com os "grandes ajustes"  necessários para a construção de uma Nova Ordem planetária, onde  boa parte da população estará excluída dos frutos da produção  mundial, quer como produtores, quer como consumidores. Ao  contrário, a volta triunfante do "lasse faire" sintoniza-se com a  atual realidade econômica de que "somente os fortes sobreviverão",  sendo, sob a óptica neoliberal, ociosos, dispendiosos e  contraproducentes esforços para integrar econômica e socialmente  contigentes de trabalhadores cuja mão-de-obra o avanço tecnológico  tornou desnecessária. Torna-se, assim, segundo o feitio  neoliberal, o Direito do Trabalho (e as instituições que dele  derivam, como a Justiça do Trabalho) um dinossauro em vias de  extinção.

 

Em termos de Terceiro Mundo, a "retirada" do Estado  na economia tem ainda outro sentido: a da abdicação de qualquer  veleidade de desenvolvimento independente, já que, nas economias  periféricas carentes de capital, o Estado é elemento  imprescindível para o desenvolvimento nacional, sendo a esperança  nutrida pela elite brasileira de que o capital internacional venha  a substituir o Estado no papel  de motor de desenvovimento nada  mais do que uma quimera.

 

Finalmente, as propostas de enfraquecimento do  Estado em países do Terceiro Mundo (conseqüência também, na medida  que decresce seu papel social) relacionam-se com estratégias que  visam minar as resistências dos povos contra as "necessárias duras  medidas" de enquadramento das economias periférias na Nova Ordem  mundial, na medida que os Estados nacionais podem tornar-se  obstáculos à implementação dessas políticas.

 

Portanto, ao contrário do que dizem os  capitulacionistas do Direito do Trabalho quando afirmam que o  recuo dos patamares mínimos de proteção contido nas normas legais  decorre de uma inevitável "flexão tática" em acordo com uma  temporária crise recessiva, em verdade tal crise não é temporária,  nem será superada nos marcos do próprio capitalismo. Ou seja: não  se pode verdadeiramente considerar tais "flexões" a não ser como  deslavada colaboração de classe, já que os empregos e os patamares  remuneratórios perdidos não mais serão reconquistados no atual  sistema. É de se recordar que tais "flexibilizações" das relações  de trabalho não acontecem apenas no Terceiro Mundo (embora  particularmente atinjam hoje a América Latina), mas processos  semelhantes são vividos na Europa e nos Estados Unidos. Em todos  os países o ponto comum é o rebaixamento dos salários dos  trabalhadores ou a implentação negociada de reduções massivas de  postos de trabalho.